quinta-feira, 3 de julho de 2014

"Aquele que obtém uma vitória sobre outros é forte, mas aquele que obtém uma vitória sobre si próprio é todo - Poderoso." (Lao-Tsé)

Essa frase acima está estampada em um sacolinha de pano que acompanha meu pai em seus dias na Papuda. Nela, há uma foto de Gandhi, mas pelo que pude saber, foi o filósofo chinês Lao-Tsé quem a proferiu. Não importa. Ela é a frase ideal para acompanhá-lo nesses dias de tanta revolta, injustiça e indignação.

Dentro da sacola meu pai carrega um rolo de papel higiênico, um caderno pequeno da copa do mundo, e outro maior, daqueles bem antigos, de capa mole, pautado, onde está escrevendo seus pensamentos, suas ideias, suas anotações daquilo que está fazendo – e sentindo - na Papuda. Sentado na cadeira de plástico onde nos recebeu, ficava sempre com a sacola pendurada do lado, perto, talvez como o símbolo de sua identidade naquele mundo amorfo de pessoas brancas, de almas pesadas e de tanta sujeira e tristeza.


Não vou mentir, não vou amenizar, até porque escrevo esse texto mais para mim mesma do que qualquer outra coisa, nem sei bem quem terá a disposição e o ânimo de ler o que vou registrar aqui. Eu não vou mandar agora esse texto para meu pai; ele lerá, quando quiser e puder, no dia em que estiver fora deste local que eu descreverei...


A minha primeira visita ao presídio da Papuda, localizado em Brasília, começou bem cedo, quando saí de São Paulo para vir para cá, e continuou ontem cedo quando nos levantamos e vestimos todos, eu, minha mãe, meu irmão e meu cunhado, roupas brancas dos pés à cabeça. Cueca branca, calcinha branca, sutiã branco, sem bojo, calça branca, camiseta branca, chinelo branco. Tudo branco. Exatamente igual à roupa que os presos precisam usar: branco. Desde que soube que isso era assim eu pensei e busquei todo tipo de explicação para essa obrigatoriedade imposta aos familiares e apesar de já ter ouvido todo tipo de ideias, só penso em uma coisa: marcar as famílias. Marcar e humilhar as famílias com a mesma vestimenta que qualquer preso do CIR-Papuda precisa usar para cumprir sua pena, mostrar, a quem quer que seja e saiba, que quem veste branco tem um familiar preso, com toda a carga emocional que isso significa. Mulheres, homens, velhos, crianças, bebês, todos de branco.


Para a minha família, e acredito que para outras que estão lá também, essa roupa é a marca mais concreta possível de toda a injustiça que estamos vivendo desde 2005. De toda a humilhação, covardia, manipulação, maldade, que vivemos há 9 anos, quase exatos 9 anos.

Quando olhei para o presídio, a primeira coisa que eu pensei foi: então tudo aquilo que meu pai fez, todos os sacrifícios, toda dedicação, todo compromisso, todo seu amor pela política, nos levaram a isso? E olhava para o lado e lá estava ela, minha mãe, minha querida e amada mãe, que também já esteve presa, que também já visitou meu pai em uma cadeia, mas quando vivíamos em uma ditadura, e não em uma democracia. Em determinado momento eu olhei para o lado e perguntei a ela: “Mamãe, como você aguenta?”. E ela me disse: “Ah, Mimi, eu não sei, não penso, só penso no Papai”. Amor, puro amor, e coragem, muita coragem.

Depois de toda fila de carros, de pessoas, de cadastro, de documento, de revista, de verificação, conseguimos entrar. Minha mãe segurava firme na minha mão, muito firme, e me falava algo que repetiu várias vezes ao longo do dia e que me ajudou muito a não me sentir uma pateta: “Eu sei o que você está sentindo, Mimi. A primeira vez é muito ruim”. Digo isso de pateta, porque era como eu me sentia, com as minhas lágrimas insuportáveis caindo, e eu no meio de um mar de gente que estava na mesma situação que eu e não soltava uma lágrima sequer. Uma. Não vi uma pessoa, mulher, velhinho, criança, chorando. Ninguém. E me sentia uma ridícula por não conseguir segurar completamente as minhas estúpidas lágrimas. Nunca tive tanta raiva da minha facilidade de chorar.


Cruzamos o portão de entrada, e de repente as grades. Grades, grades, grades, para todos os lados, uma escuridão, grades, chão sujo, grades, policiais, grades, gente no chão, grades... aquilo foi me oprimindo, eu não sabia como aguentar, mas eu tinha a mão da minha mãe me segurando. De repente um policial veio abrir o portão e falou: “Ué, chorando? Chorando por quê?” e aquilo acho que foi a coisa mais violenta que vivi em toda a minha visita.


Chorando por quê?


Naquela frase o símbolo da estranheza do funcionário, por uma manifestação humana tão verdadeira e tão emotiva como a lágrima. Naquela pergunta, a cobrança por uma postura diferente para um lugar que parece ter se acostumado ao massacre do sentimento. Naquele momento, a raiva e a vontade de gritar: Sim, estou chorando, porque estou vindo visitar meu pai, um homem de 68 anos, doente, com problema de saúde, honesto, bom, humilde, e que fez muito por você e pelo país e graças à nossa mídia nojenta e à covardia de pessoas com poder de decisão, terminou aqui. Nesse lugar. Sim, chorando, porque a indignação é o primeiro passo para não se resignar e eu nunca vou aceitar essa condenação que impuseram ao meu pai. Chorando porque ele é inocente!!!!!!!!!!!!!!”.


Mas óbvio, não falei nada. Só a minha mãe respondeu: “É a primeira vez dela aqui”. E nesse momento, senti alguém se aproximando e vi, por entre as grades, meu pai. Não sei quanto tempo demorou para o policial terminar de destrancar a grade, mas aqueles segundos entre vê-lo e abraçá-lo foram certamente os segundos mais longos de toda a minha vida... e quando por fim nos juntamos, nem sei o que aconteceu. O mundo parou.


Eu só me afundei naquele abraço, fechei meus olhos e chorei e apertei meu pai. Apertei firme, abracei e disse muitas vezes como eu o amava. Meu pai não me soltava, apenas me abraçava e beijava a minha cabeça. Eu só me imaginava fora dali, fora, longe, em outro lugar. Todos os abraços que eu dei no meu pai eu fechei os olhos, para não me ver abraçando-o ali no presídio, mas fora, em casa, nas montanhas que eu tanto desejo um dia subir com ele.


Eu parei de chorar. Sim, isso é importante. Eu chorei muito mas percebi rapidamente que precisava parar, não porque era errado chorar, mas para aproveitar o tempo, estar com meu pai, conversar, viver aquele pequeno tesouro que é estar com ele. A sua primeira providência foi me apresentar aos outros condenados que eu não conhecia... assim, depois de dar um abraço no Delúbio e no Zé Dirceu, meu pai me apresentou ao Jacinto Lamas, ao Valdemar da Costa Neto e ao Bispo Rodrigues. Todos me receberam com um sorriso e de diferentes formas me falaram: que bom que você veio.


Quem está fora e sabe que a AP470 foi uma mentira e uma das maiores aberrações jurídicas da história do nosso país deve se perguntar como foi, como é, juntar algumas dessas pessoas que foram atingidas por essa violência da injustiça, como é viver em grupo entre todos os que foram injustiçados e massacrados de tantas formas possíveis. Revolta? Sim. Indignação? Sim. Amargura? Não. Resignação? Não. Depressão? Não. Existe companheirismo, existe força, existe união, e existe resistência. Resistência para poder suportar essa vida tão difícil que caiu na vida de cada um... percebi que a maior resistência deles é a fortaleza de espírito, a capacidade de rir, de gargalhar até, das grandes e pequenas coisas, a força do homem contra a maldade... impressiona quando a gente vê em escala maior, porque eu só via até agora na presença do meu pai.


Meu pai fez de tudo para me colocar por dentro da sua vida. Me apresentou aos funcionários, me mostrou o pátio onde pode tomar sol e caminhar 1 hora por dia, me mostrou sua comida.


A você que teve paciência de ler até aqui eu digo: o meu pai está em um lugar horrível. Horrível porque é sujo, feio, tem pombos por todas as partes e vimos um rato, acho que uma ratazana, enorme, circulando por lá. O banheiro é péssimo, claro, pois para quem não sabe (e que bom que nunca precisou saber disso), não tem vaso sanitário, é apenas um buraco no chão. “Já me acostumei, Mimi”. Eu não pude ver a cela, pois ontem os companheiros do meu pai iam ser transferidos e estava uma grande movimentação de pessoas, então os policiais acharam melhor eu não ir.


A partir desta semana meu pai ficará sozinho naquele lugar. Seus companheiros foram e serão transferidos para outro presídio, onde dormirão depois de terem saído para trabalhar durante o dia. Eu tento pensar menos do que minha mente quer, sobre o fato de meu pai ficará lá agora sem ninguém, porque se eu pensar muito tenho certeza de que vou perder a minha cabeça... ele diz que está bem, que está preparado, e que “vai dar tudo certo”. Mas a verdade é que estar lá já é de uma opressão e uma indignação tão grande, para um homem inocente, imaginem sem ter colegas, companheiros, parceiros para ajudar e encarar a situação... e diante disso tudo o que mais me emocionou foi perceber a alegria que meu pai sente de que seus companheiros possam sair, possam ter seu direito de trabalhar, de vencer aqueles muros.


Bem, eu poderia escrever páginas e mais páginas de tudo que senti e vivi ontem, mas o que mais posso dizer agora, quando tento terminar meu pequeno grande relato desabafo é que algo muito difícil para mim, para além do lugar em si, foi a leitura dos sentimentos do meu pai... eu e ele temos uma ligação muito forte, muito mesmo, e eu consigo saber muito rapidamente o que ele está sentindo e pensando.  E aí eu ia vendo tantos sentimentos diferentes passando e repassando por ele durante nosso tempo lá... mas o que mais me doía era quando eu percebia o sentimento de uma certa angústia por ver os filhos lá. Seu olhar ansioso quando voltei do banheiro, sua forma de me mostrar sua comida, sua maneira de contar sobre sua vida lá dentro. Eu sou mãe e consigo tentar imaginar o que é para ele estar ali e ver os filhos vendo-o ali.


O tempo de uma visita passa muito, muito rápido. Falamos sem parar, conversamos de todos os assuntos possíveis, ele passou recados, mensagens, e até recomendações de coisas a fazer... me ajudou a estabelecer a minha lista de prioridades, que foi algo que andei lhe perguntando nas minhas cartas, para saber como vencer os diferentes desafios que foram caindo na minha cabeça ultimamente, desafios para além da sua prisão.


Para terminar eu preciso dizer que eu só aguentei aquilo tudo porque eu tive muita força, muita energia positiva, muito amor de muita gente, muito pensamento positivo enviado para mim. Eu senti a presença e a força de todas essas pessoas que de formas tão importantes e marcantes me ajudaram a aguentar... e quero que saibam que meu pai está bem, dentro do possível, mas está bem. O bem que eu digo é de cabeça, de força, de emoção. De saúde está segurando como pode com o apoio incondicional do serviço médico da Papuda que faz o que pode, sabendo que não poderá resolver seus problemas de saúde totalmente, porque o seu índice de coagulação não vai se estabilizar naquelas condições, com aquela alimentação, aquela situação. Só podemos esperar, torcer e rezar, rezar muito para que seu corpo aguente o tempo que lhe resta sem nos dar nenhuma surpresa. Não podemos contar com a justiça, precisamos contar é com a fé.


"Aquele que obtém uma vitória sobre outros é forte, mas aquele que obtém uma vitória sobre si próprio é todo - Poderoso."


De novo a frase, porque ela é perfeita para encerrar esses pensamentos. Meu pai está conseguindo vencer a si próprio, seus limites, seus sentimentos, vencer ele mesmo e a vontade de desistir. Ele está firme no propósito de resistir, de superar, aguentar, para na sua saída, comer a comida que escolher, que desejar, que sonhar.


“Qual é a comida, Papai, que você deseja comer?”


“Um arroz com feijão e uma cozidão. Um cozidão de frango”.


Seus olhos nesse momento sorriram.

Esse é meu pai.

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Carta para o Pacheco

10/06/2014

Querido Pacheco,

Te escrevo essa carta hoje, um dia tão forte para você e consequentemente para nós também, porque ando com a cabeça muito fora do eixo, dando umas bolas foras com as palavras orais e sentindo mais firmeza nas palavras escritas. Talvez, se eu te telefonasse, não conseguiria expressar tudo o que gostaria, tanto quanto acho que poderei colocar aqui.

Sabe Pacheco, apesar de minha profissão de educadora estar de alguma forma bem distante da sua, o direito sempre esteve meio próximo de mim, de jeitos muito significativos, e marcantes também. Meu pai esteve em uma faculdade de direito e apenas pela ditadura não terminou seu curso, e depois, duas grandes, grandes amigas minhas entraram no direito. Uma delas, uma amiga de infância, acabou me juntando em muitos momentos com os seus colegas de faculdade e por isso enquanto me constituía enquanto pedagoga, acabei acompanhando pessoas queridas se formando no direito.

Isso tudo para dizer que sim, para mim esse mundo jurídico de vocês é muito estranho e cheio de leis, decisões, decretos, e muito diferente do meu mundo, cheio de crianças, de espontaneidade, de "combinados", mas é um mundo que respeito profundamente, que admiro e que é cheio de gente muito, muito especial para mim.

Desde que meu pai foi colocado de forma tão injusta nesse processo, tivemos todos nós que ir adentrando nesse mundo jurídico e assim, ir estabelecendo uma relação com você, advogado dele. No começo, não era nosso foco de atenção, afinal, era algo entre meu pai e você e nós ficávamos apenas sabendo das coisas, acompanhando... Porém, desde o dia 15 de novembro tudo mudou porque meu pai perdeu a liberdade, a voz e fomos precisando estabelecer uma relação, nós, a família, e você, o advogado dele.

Nem sempre foi fácil porque estamos desesperados, queremos respostas, desejamos ações e você ia sempre precisando ir trazendo o dado de realidade, as leis, as possibilidades, as ações jurídicas, os pedidos dentro desta ou aquela lei. Todo esse processo foi para nós uma eterna luta e embate com esse muro da (in)justiça, dos trâmites e das burocracias, com sentenças, decretos e pareceres e para quem está de fora deste mundo e pior, para quem tem seu familiar assim nessa situação, isso tudo vai sendo uma prisão para nós.

É por isso que te escrevo para dizer que você hoje lavou a nossa alma. Você colocou no plenário o sangue, a força, a energia, a convicção que tantas vezes nós, de fora, ansiávamos de todas as formas por nossa condição de angústia e desespero. Você hoje, Pacheco, falou com clareza e com certeza porque se apóia na verdade e sabe que quem está do outro lado não só está indo contra o direito, como ele próprio sabe que o que está fazendo é ilegal e pior de tudo, desumano.

Eu, ao ver o vídeo, tive que escolher entre dois sentimentos: o do ódio pelo opressor, e o da admiração pelo defensor. Claro que escolhi o segundo. Claro e óbvio porque isso que aconteceu hoje só deve ser visto dessa forma, pela sua atitude digna e corajosa de decidir mostrar veementemente que a situação do meu pai não pode continuar como está, que não se pode seguir assim, protelando e atrasando, descaradamente sem entender que uma vida humana está em jogo.

Eu sei, Pacheco, que ao longo desse processo vocês advogados amigos, sofreram muito, porque tudo que foi acontecendo ia contra todos os precedentes, leis, decisões e a angústia deve ter sido tremenda. Mas considero que hoje você mostrou que o direito não precisa ser lei e sentença, ele pode ser vida e luta também, ele pode ser força, decisão e determinação. O direito pode ser coragem, pura coragem.

Agora, tentarão manchar sua imagem, dizer baboseiras, inventar e caluniar, mas é tarde demais. O vídeo é claro, as atitudes são explícitas e não há nada que possa ser dito que conseguirá mudar o fato de que hoje uma atrocidade foi cometida contra você, simplesmente por ser o advogado de José Genoino. Mas tudo tem seu preço, e todo mundo, cedo ou tarde, precisará arcar com as suas escolhas. Fico feliz em saber que a sua escolha foi a da convicção e dos valores, porque a sedução do poder já levou muita gente a escolher a perseguição, a difamação e a tortura em todos os sentidos.

Estamos juntos e lutaremos juntos até o fim.

Hoje você lavou nossa alma e estou certa de que meu pai, quando ficar sabendo, sentirá enorme orgulho de ter você como advogado.

Um abraço,

Miruna

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Muitas cartas dentro de uma só!

Olá meu Papai amado,



Hoje quem vai escrever essa carta não sou eu, mas sim algumas das muitas pessoas amigas que têm nos acompanhado nessa jornada. São pessoas que você conhece mais, conhece menos, algumas você nem conhece diretamente, mas que foram vivendo conosco nossa luta, nossa dor, e encontraram as palavras mais lindas possíveis que pudessem de alguma forma confortar a nossa dor.
Eu sempre vi essa coragem dos amigos e amigas em falar abertamente que estão conosco, que acreditam em nós, em dizer que sabem quem você é de verdade como uma das maiores provas de amor verdadeiro e amizade profunda que apenas pessoas muito especiais conseguem dedicar ao outro de forma tão generosa e verdadeira. Acho que ainda que tenhamos recebido muitas pedras, são essas pessoas, as anônimas para o grande público, mas as tão conhecidas e importantes para nós, as que vão nos dar a força necessária para levantar a cabeça e seguir em frente.
Veja, meu Papis, algumas das muitas palavras especiais que recebemos ao longo de todos estes anos de injustiça e de massacre:

“Eu acredito nele, acredito no meu partido e no meu presidente. Acredito na sua família, acredito na sinceridade e no amor de vocês. Acredito na minha amiga e em seu pai. Acredito em quem nunca precisou mentir. E nunca, nunca mesmo, sinta-se na obrigação de sair em defesa dele, de sua família e dos seus valores para os seus amigos. Não é preciso, minha querida, porque o respeito que vocês tinham que conquistar, JÁ ESTÁ CONQUISTADO, e não será abalado.”


“Estamos junto de vocês, torcendo para que tudo dê certo e nunca se esqueça que o vínculo entre pai e filha é algo muito mais sólido e puro que todo o resto. O amor entre pai e filho tem a solidez de uma rocha, é perene e não sucumbe ante as circunstâncias da vida.”

“É o essencial que precisa prevalecer: o essencial no qual você acredita, o essencial que pulsa dentro de vocês, o essencial que está nas pequenas grandes coisas, como o sumo do suco de limão que ele te leva na cama e a simples e verdadeira queijadinha que você compra pra ele.
Conte com isso sempre!!!”

“Penso que a vida é um dom gratuito, algo que nos foi dado sem sabermos a razão e que a grandeza está em conseguir dela desfrutar sem medo de perdê-la, sem medo de doá-la em nome de um sentido maior que a ela atribuímos. Vejo o seu pai como um exemplo dessa entrega, um exemplo do qual somos tão carentes e do qual tanto precisamos para nos inspirar a trilhar o mesmo caminho. Por favor, transmita a minha solidariedade a ele, a minha gratidão e também o meu pedido para que não desanime, não perca as esperanças e continue esse importante projeto que já construiu até aqui. Nós precisamos dele!”

“Seu pai teve a força e a dignidade de lutar pela vida dele quando pequeno e, quando grande, de lutar por outras milhares que precisavam de apoio, que precisavam da voz dele para se fazerem ser ouvidos e vistos. Acho um orgulho poder, mesmo que de longe, conhecer seu pai. Poder dizer que existem pessoas guerreiras, que lutam pelo o que acreditam é infelizmente um “privilégio”, quando deveria ser um fato. Todos deveriam ser assim. Mas se não o são, que o tomemos como exemplo...um belo exemplo…”

“Tenho Orgulho profundo em ter dividido com ele muito dos ultimos anos em Brasilia, que representam pra mim exemplo de abnegação, de determinação, de coragem e de honestidade. Poucas pessoas conheci que fossem tao insuscetíveis aos encantos proporcionados pelo dinheiro e pelo poder. Receba esta mensagem como sinal de gratidão e de amor ao Grande Jose Genoino.”


Essas pessoas estiveram conosco em cada facada que fomos recebendo ao longo de todo este processo tão absurdo e injusto. Choraram por nós, nos abraçaram, levantaram polêmicas entre seus conhecidos e familiares, vieram a nós, bordaram e costuraram os pedaços doi nosso coração com palavras de confiança, afeto e carinho. Eu tenho certeza de que no dia em que eu e você estivermos juntos de novo, livres, estas mesmas pessoas estarão novamente conosco, respirando felicidade, porque finalmente poderão ver que alguma paz chegou até nós. Isso é o que mais me emociona, que no meio de tanta mentira e manipulação, de tanto ataque e destruição, tenhamos conseguido juntar um grupo tão grande de gente que não nos abandonou e que dedica tempo, carinho e palavras para de alguma forma mostrar que estão aqui conosco.


Hoje, a minha carta leva o sentimento de muita gente também. Essa gente toda, assim como eu, não pode entrar aí na Papuda para te dar um abraço, te olhar nos olhos com admiração ou dedicar umas palavras verdadeiras. Mas podem chegar até você do mesmo jeito que eu tenho feito, por meio desta carta, por meio de palavras, de frases, de sentimentos escritos no papel que possam dar a você toda a força do mundo que te faça resistir a esse mundo de injustiça e de dor.


Eu te amo meu papai amado. Que as palavras continuem nos unindo até o dia em que pudermos nos abraçar de novo.


Muitos beijos da sua,


Mimi

sexta-feira, 2 de maio de 2014

Para você, Papai, no dia do seu aniversário

Papai,

Toda vez que eu passo na frente do seu escritório para estender a roupa das crianças, ou para pegar um livro que a mamãe pediu, me lembro do que aquele lugar já significou para mim, e de como agora ele está vazio sem você. Já quando seu escritório era dentro de casa, era um lugar meio aberto, meio secreto, o melhor lugar para eu e o Nanan brincarmos de... escritório, claro. E ainda que fizéssemos bagunça, mesmo se acabássemos mexendo nas suas canetas, mesmo deixando os seus CD´s todos bagunçados, você nos compreendia. A única coisa que você não gostava mesmo que a gente mexesse era na caixinha com nossos dentes de leite e na caixona com todas as cartas e bilhetes que escrevíamos para você.

Não sei onde está essa caixona, mas sei que está guardada. Lá estão cartas e cartões de aniversário, bilhetes de boas vindas à casa depois de uma semana fora, mensagens e mensagens de toda uma vida juntos. Faz tempo que eu não colaboro com a sua caixa... agora, quando a vida arrancou você de perto de mim, quando não posso mais cuidar de você e da sua saúde, vamos precisar voltar a acreditar na caixa, onde você um dia guardará estas cartas que escrevo aqui, no meu blog, mas que só poderão chegar a você impressas, em mãos, pela mamãe, toda quarta-feira.

Papai, hoje é seu aniversário. Hoje celebramos o dia em que você nasceu, um dia muito intenso, já diria nossa querida amiga dos astros, pois os planetas se alinharam trilhando um caminho de muita luz. Que poderia atrair muita sombra alheia também. Mas hoje eu não quero pensar nisso, em quem não soube aguentar a sua força de vida, em quem precisou da mentira e da calúnia para tentar apagar sua história, em quem é frágil demais para falar a verdade sobre José Genoino.

Hoje, eu quero falar de você. Porque hoje é seu dia. Não importa que você esteja preso, e eu longe. Não importa que seus netinhos hoje não possam fazer o bolo de cenoura que você tanto gosta (e que é o único que aceita para cantar parabéns). Não importa as lágrimas que eu, a mamãe, o Nanan, a Mari, o Pedro e o Miguel vamos viver por estarmos longe de você nesse dia. O que importa é que é o seu dia, e essa energia, ninguém, por mais que queira, poderá roubar.

Hoje eu tenho certeza de que muitas e muitas pessoas estão pensando em você. E estas pessoas estão agradecendo a sua existência, o dia em que você nasceu, porque nesse dia certamente o mundo ficou muito melhor. Ficou melhor, ficou mais ético, ficou mais humano e ficou mais generoso. Ficou genuinamente melhor. Porque você é assim, isso e mais um pouco, tudo junto e misturado, abrindo com a força de mil leões os caminhos mais difíceis.

"Mamãe, quem vai estar com o vovô na festa de aniversário dele?" foi a pergunta que o Luismi me fez. "Ele vai ficar sozinho?". Não, não vai. Podemos estar longe de você fisicamente, mas estamos aí, bem do seu lado, com toda a nossa verdade e todo nosso amor por você. Estamos aí gritando para o mundo que temos orgulho profundo de sermos sua família. Estamos aí dando o abraço mais apertado do mundo para que você não esqueça, nem por um minuto, que nesta jornada, não importa quão sofrida seja, estaremos sempre juntos.

Eu estou tentando cumprir a promessa que fiz a você. Estou. Com a ajuda da mamãe, do Miguel, das crianças, de todos, eu espero conseguir cumpri-la. E acredite Papai, por mais que eu esteja sofrendo como nunca achei que fosse possível sofrer, pode ter certeza de uma coisa: se esse é o preço que tenho que pagar por ser sua filha, eu pago. Não me importa. A vida me deu você de presente, e por isso eu a ela serei sempre grata.

Te amo do fundo, do mais fundo do meu coração. Sem você eu não seria nada.

Um beijo,

Mimi - 03/05/2014

segunda-feira, 28 de abril de 2014

POR FAVOR AMIGOS, ME AJUDEM A DIVULGAR A VERDADE SOBRE A SAÚDE DE MEU PAI!

Por Miruna Genoino

É VERDADE QUE ELE NÃO ESTÁ EM ESTADO GRAVE?

É verdade, mas ele está assim, estável, porque está cumprindo sua injusta pena em um DOMICÍLIO, sob os cuidados de sua família, o que é FUNDAMENTAL já que, lembremos do artigo que saiu no Jornal GGN (http://www.jornalggn.com.br/noticia/a-cardiopatia-de-genoino-e-as-doencas-especificadas-em-lei),

“Um dos fatores de risco predominantes, tanto na gênese inicial como na recidiva da dissecção de aorta é a hipertensão arterial. Todos sabemos, até os leigos, que situações de ansiedade e estresse podem levar a crises hipertensivas. Onde o periciado tem mais chances de ser submetido a situações estressantes: Em seu domicílio, rodeado de seus entes queridos, que velam por ele, com alimentação adequada e sossego ou em um ambiente prisional brasileiro?” 

É VERDADE QUE ELE TEVE “APENAS” UM PROBLEMA NA AORTA E QUE O MESMO JÁ FOI CORRIGIDO COM A CIRURGIA E POR ISSO ELE NÃO PRECISA MAIS SE PREOCUPAR COM ISSO?

NÃO. Não foi “apenas” um problema na aorta, foi um problema muito, muito grave, que poucos sobrevivem para contar. Lembremos que

“Em respeito ao Deputado, não vamos ficar expondo estatísticas do mau prognóstico da doença. Basta replicar aqui a parte conclusiva de um trabalho da equipe de cirurgiões torácicos do Hospital Universitário da Universidade de Coimbra-Portugal. Eles atenderam 78 casos de dissecção em dez anos e concluem assim (Atenção! Na primeira frase temos sintaxe Camoniana!):

     “A cirurgia é raramente, se é que alguma vez, curativa; por isso, o controlo a longo prazo (provavelmente para toda a vida) é essencial e inclui o controlo apertado da hipertensão arterial e a vigilância dos segmentos aórticos não excisados e, em especial, do falso lúmen patente distal, numa tentativa de evitar a rotura e minimizar as consequências da formação de falsos aneurismas”
“Como factores de risco predominantes observaram-se a hipertensão arterial, a doença do tecido conjuntivo, o tabagismo e a insuficiência renal crónica”
Dissecção Aguda da Aorta - DAVID PRIETO, MANUEL J. ANTUNES

SE A CIRURGIA FOI BEM SUCEDIDA, ENTÃO NÃO HÁ NADA MAIS A CUIDAR?

NÃO!!!! Meu pai teve um episódio de isquemia cerebral que o levou a começar um tratamento com anticoagulantes que ainda NÃO CONSEGUIRAM SE AJUSTAR CORRETAMENTE! Atualmente seu índice de coagulação ainda não está entre o nível 2 e 3 que é o que ele precisa ter, vide relatório de seu médico Dr. Geniberto Campos:

“A medicação anticoagulante oral (warfarina), mesmo com ajustes frequentes, ainda não conseguiu atingir níveis terapêuticos satisfatórios, com RNI abaixo de 2 (valor terapêutico ideal entre 2 e 3).”  Brasília, 8 de abril de 2014 - Dr. Geniberto Paiva Campos

QUANDO MEU PAI FOI PRESO NA PAPUDA ELES O DEVOLVERAM COM O ÍNDICE ACIMA DE 5, UM ÍNDICE QUE INDICA UM RISCO ENORME DE HEMORRAGIA!!!!!

Por favor, amigos, me ajudem, Divulguem a verdade, gritem se for preciso. Não deixem que a Folha, a Globo e a grande mídia continuem propagando mentiras que estão colocando em risco a vida de meu pai! ESTES GRANDES MEIOS ESTÃO MANIPULANDO INFORMAÇÕES SOBRE A SAÚDE DE UM SER HUMANO!

E que todos saibam algo, não me importa nada, nem ano de eleição, nem partido, nem moderação, se mandarem meu pai para a Papuda eu juro que vou lutar até o fim para responsabilizar quem quer que seja pela vida de José Genoino, sejam esses que diretamente estão decidindo por isso como se fosse um mero jogo de cartas, sejam aqueles que viram a cara e preferem fingir que não têm nada com o assunto, sejam uns e outros que deixam de honrar sua promessa feita quando se formaram médicos, de sempre colocarem o cuidado com a vida humana acima de qualquer coisa.

NOS AJUDEM POR FAVOR. É PELA VIDA DE JOSÉ GENOINO QUE ESTAMOS AQUI PEDINDO O SEU APOIO.

quarta-feira, 19 de março de 2014

Que a vida cuide de você, minha amiga...

Querida amiga,

Você lembra? Quanta coisa juntas...
Durante toda a minha vida estar com você sempre fez parte da minha vida não como um descanso, uma pequena diversão, mas sim como uma grande e verdadeira necessidade. Estar com você, contar sobre mim, escutar sobre sua vida, planejar coisas juntos sempre me deu uma alegria e uma satisfação que poucas coisas na vida conseguiram oferecer. O Miguel sabe e viveu na própria pele a dor que eu sentia quando estava na Espanha e não podia ter você a meu lado... eu sentia uma falta enorme de alguém que me procurasse, que sentisse a necessidade de estar comigo, de alguém que ia sentir minha falta se eu me ausentasse de algo, ou de uma pessoa que estaria do meu lado quando eu precisasse desabafar. Lembro de um feriado, cheio de festa e acontecimento lá em Sevilha, e por ser seu aniversário e eu estar longe, chorei e chorei, sentindo a dor da saudade.

Chorei por saber que você se casava e eu estava longe e sofri quando soube que, assim como eu, você tinha se tornado mãe. Em parte porque você não me viu barriguda e não pôde fazer uma chá de bebeê para mim... Eu estava enrolada em uma toalha do corinthians, lembro bem, quando soube que sua filha nasceu. E depois, quando o Luismi estava abrindo caminho para vida, estive com o colar que você me deu, segurando forte a cada contração, como se com ele eu caregasse todas as amigas que eu queria que estivessem comigo do meu lado.

Depois que voltei ao Brasil as coisas melhoraram e muito... pude ver seus filhos crescerem, conheci seu apartamento novo, você me levou para a fazenda e cavalgou junto com meus filhos. Você fez uma festa junina especial só para a criançada e teve coragem de ir com meus dois filhotes, mais seus outros dois filhotes, um de menos de 6 meses, passear no shopping para procurar uma livraria. Pudemos estar juntos, fazendo piqueniques gostosos, almoços, jantares, eu dei mamadeira para sua filha e coloquei ela para dormir... Juntas, nós pudemos formar um grupo gostoso de amigas, compartilhamos segredos, encontramos alívio para as coisas que não entendíamos, e junto com você, encontrei tantas amigas, uma delas, pura poesia, a outra, axé dos pés a cabeça, uma companheira, outra pura sintonia... tantas coisas juntas em um só grupo de amigas.

E no meio de tudo isso amiga, saímos para comer juntas, em um mexicano, com nossos amigos de tantos, tantos anos... amigos de toda uma vida. Rimos, abrimos convites de casamento, e celebramos a vida. Vida. E veio o que veio, veio o 15 de novembro.

Minha amiga querida, desde aquele dia, acho que talvez você sinta o mesmo que eu... desde aquele dia você nunca mais me encontrou... e eu também. Sim, você esteve ali comigo. Você estava lá, com seus braços para me segurar quando meu pai se foi, e não me deixou cair no chão. Largou tudo o que estava fazendo no meio de um feriado e foi na Polícia Federal. Você me abraçou, comprou um sanduíche para meu pai, segurou a minha mão e escreveu em um cartaz que meu pai é inocente. Seu marido quase saiu no tapa com a rede Globo para defender minha família e você me deu uma água abençoada de Aparecida do Norte. Você me olhou dizendo sem palavras: eu estou aqui... você cuidou dos meus filhos, cuidou de mim, me recebeu na sua casa, aguentou meu choro e mesmo vendo meu rosto desfeito, sorriu para mim e disse: que bom te ver. Minha amiga... sei que em muitos momentos foi difícil estar do meu lado, vendo uma dor tão materializada, mas você ficou comigo, sentadinha do meu lado, durante uma pizza com amigas, na festa da firma, em um sofá cheio de confissões.

Mas amiga, eu não estive aí para você... não pude te ajudar a decidir se aceitava uma promoção especial e linda no seu trabalho, não estive pronta para ouvir suas dificuldades, faltei em encontros e deixei de estar com você naquela festa do seu filho. Amiga, que dor eu sinto quando penso que no dia do seu casamento eu estava com o coração em fragalhos e não pude sorrir como você merecia... Eu esqueci o seu aniversário, não respondi o seu e-mail e meu facebook apenas mostrava as minhas injustiças. Eu não comentei as fotos dos seus filhos, não curti tudo o que eu queria curtir, porque não conseguia entrar, estar presente, ver a sua vida, sua tão importante vida...Quando você me ligou, eu não atendi, quando você precisava de mim, não pude te ajudar, porque você sabia que eu não conseguiria te ajudar muito... E por isso amiga, eu sinto muito, muito.

Você às vezes me falou: que guerreira! como consegue dar conta de tanta coisa? Pois bem... eu não consigo... tenho conseguido trabalhar, cuidar dos filhos e ir para Brasília cuidar dos meus pais. Mas não estou conseguindo cuidar de você, de nossa amizade. E vou vendo isso à distância, sofrendo, mas sabendo que ainda vai demorar um pouco para isso passar e esperando do fundo do coração, que você entenda. Que quando isso tudo se acabe você ainda sinta minha falta. Que ainda queira me contar suas coisas, que volte a me chamar para comer um bolo, ops, não, uma torta salgada, na sua casa. Espero que ainda confie em mim para pedir um conselho, compartilhar uma alegria, pedir ajuda para organizar uma festa de aniversário. Eu espero do fundo do meu coração, que a vida cuide de você minha amiga, que são tantas amigas, enquanto eu não posso cuidar de você... e que saiba que ainda me importo muito com nossa amizade, mas simplesmente nesse momento não posso provar isso a você do jeito como eu gostaria.

Espere de verdade, que eu vou voltar.

Um beijo... te amo.

Mi

domingo, 23 de fevereiro de 2014

A dona da mochila ilustrada

O sinal indicando que o telefone estava chamando tocou uma, duas, três vezes. No quarto toque, a voz dela: 

- Alô?
- Mamãe, é a Mimi, o que aconteceu com o papai?
- Calma Mimi, está tudo bem. Fique aí, fique tranquila, ele passou mal, mas está sendo cuidado. Ele está bem.

Ele não estava bem. Mas ela não sabia. Ele, é claro, meu pai, ela, essa mulher indescritível, Rioco Kayano, minha mãe. Foi ela que ficou ao lado do meu pai durante as 15 horas que separaram a primeira dor da dissecção da aorta, da entrada para o centro cirúrgico. Foi ela que sentou como pôde do lado dele na ambulância, na cadeira lateral onde seus pés encaixavam como dava, aguentando firmemente com a força de seu olhar, todo o trajeto de subida da serra de Taubaté, rumo a São Paulo. Foi ela que, quando soube que era grave, muito grave o que meu pai tinha, conseguiu tirar forças de não sei onde para me dizer: "Mimi, acredite no seu pai, ele vai aguentar. Se você aguentar, ele vai aguentar".

Ele aguentou.

Era uma mochila toda ilustrada com mapas. Nem pequena, nem grande, mas leve, fácil de carregar. Estava assim de ladinho no ombro dela, encostando na camisa polo laranja. A mão que segurava a mochila, era pequena, mas forte, e firme. Veio descendo, descendo, encontrou a grade e disse: "Eu me despedi do papai, ele está forte, chegou a hora, a gente se preparou para vencer essa, a gente vai vencer". Minha mãe. De novo. Na porta da polícia federal em São Paulo, quando meu pai foi preso.

Daquele dia em diante a mochila ilustrada junto com a sua dona nunca mais voltou para morar em São Paulo. Porque desde que meu Genoino pai foi preso minha Rioco mãe está guerreira, colossal, do lado dele, segurando todas as cordas que vão arrebentando, e costurando com sua paciência e tenacidade nipo-brasileira, cada fiozinho que parece que vai se soltar. É muito, muito difícil vê-la longe daqui, de alguma forma cumprindo prisão domiciliar junto com meu pai. É triste olhar para sua casa que agora eu habito, e ver suas linhas e panos solitários, sem a mão bordadeira para transformar... é desgarrador ver suas pinturas colocadas em tantas paredes da casa, sabendo que as mãos firmes da nossa baixinha não puderam nunca mais voltar ao ateliê onde ela se realizava entre telas, pincéis e cores, tantas cores.

A minha mãe é uma mulher feita de muitas cores, tantas cores que seria impossível descrever qual delas atrai mais as pessoas, as amigas, os colegas, as parceiras de bordado, as irmãs... seus filhos e netos. E seu marido, claro. Eu sinto muita, muita falta da minha mãe aqui do meu lado colocando a cor que eu tanto preciso para seguir em frente com os desafios da vida... mas aguento esse buraco como dá, porque sei que ela é a única pessoa nesse mundo capaz de garantir a saúde de meu pai, e é por isso ela não pode desgrudar dele de jeito nenhum.

Minha mãe e meu pai têm uma história que não é apenas de amor, amor intenso e verdadeiro, daquele que aguenta anos de prisão e separação, mas é também uma história de entrega total e absoluta ao outro, custe o que custar. Na história deles não existe o "talvez", o "será", o "quem sabe". Existe o "vamos". Porque eles sempre olham para a frente, sempre.

É por isso que mesmo sendo tão difícil a situação que vivemos, meu pai consegue de alguma forma se estabilizar com a presença de sua baixinha do lado. É ela que cuida de cada uma de suas refeições, não deixando ele escapar nem por um milímetro dos cuidados que ela elaborou. É ela que organiza como pode a ginástica diária que movimenta de alguma forma o corpo cansado de meu pai. É ela que consegue perceber quando alguns sinais indicam que as coisas estão mais difíceis e é preciso uma ajuda profissional. É a minha mãe que está lá, incondicionalmente, ao lado do meu pai, para que nunca mais ela tenha que ter medo de se realmente pode dizer aos filhos que ele vai aguentar.

Durante estes mais de 90 dias de calvário, a única vez em que fiquei com medo da reação da minha mãe, e que achei que ela não ia aguentar, foi quando soubemos, nos primeiros dias da prisão do meu pai, que ele estava passando mal, com a pressão desregulada, e não existia um tratamento adequado dentro do presídio. Naquele dia ela gritou com lágrimas nos olhos: "Estão querendo matar o Genoino?". Foi de uma dor profunda, profunda...

Eu nunca vou esquecer daqueles olhos. Olhos de amor, de desespero, de angústia. Olhos de alguém que já aguentou de tudo, olhos de uma mulher que é capaz de escalar o mundo para cuidar e ser a companheira incansável do meu guerreiro pai.

Minha mãe está longe, longe... não posso mais almoçar com ela, pedir que ela faça um udon e levar as calças do Luis para costurar (no joelho, sempre no joelho). Ela está longe e não pode ir comigo encontrar a paz de nosso grupo de bordado. Ela está longe e não podemos ser eu e ela, mãe e filha, plenamente. Sofro, sofro demais, mas sei que ela está longe porque está perto, pertinho, grudada, no "Gê" dela, pronta para segurar todas as angústias, firme para dar todos os suportes, forte para ser o ponto de apoio de um homem que se certamente não sucumbiu até agora é também porque sabe que tem o apoio de uma mulher única, especial para além dos limites do possível, que estará do lado dele sempre. E que sempre acredita que ele vai aguentar.

Mamãe, eu te amo muito. Mesmo.